A Esmorga / MDL / PGL - A última semana das I Jornadas de Língua em Ourense têm uma nutrida participação portuguesa. Amanhã mesmo, 24 de Abril, o salão de actos da EOI de Ourense será palco para a palestra «O galego visto de Portugal», na qual marcarão presença José Manuel Almeida, colaborador minhoto do PGL e Nuno Gomes, colaborador varzinense do Novas da Galiza.
José Almeida, membro do Conselho de Redacção do PGL, e que acompanha intensamente a realidade e sociedade galega, irá dar a sua visão sobre o conhecimento (ou desconhecimento) da variante galega da língua em Portugal, tentando encontrar explicações, em várias áreas (política, cultura, história, etc.) e em ambas as beiras do Minho, para a situação actual. Irá explorar possíveis caminhos evolutivos para o relacionamento transfronteiriço Galiza/Portugal e o papel fulcral e primordial da língua nesse relacionamento.
Nuno Gomes Lopes não sabia do que falar. Sentiu-se tão honrado pelo convite que se achou incapaz de dizer que não, e parecendo-lhe que deveria ser científico quanto a isto, propôs-se a ler Dois lados de um rio, de António Medeiros, até à data da conferência. Para condimentar com um pouco de literatura, propôs-se também a acabar a leitura das Folhas Novas, de Rosalia de Castro. Quando em Ourense, conversará com quem o quiser escutar sobre estes e outros livros. E sobre a língua, já agora.
A seguir, publicamos uma pequena entrevista que lhes realizamos, para ir fazendo boca a respeito daquilo que poderemos ouvir na palestra de amanhã:
Para o cidadão médio português que se oculta atrás do epíteto Galego?
J.A. Infelizmente - e sabendo que vou ser um pouco bombástico e fatalista - oculta muito pouco, para não dizer mesmo, quase nada. Para a generalidade dos portugueses, mesmo do Norte, o galego é na melhor das hipóteses (isto é, na hipótese de saber que existe) um dialecto do castelhano e a Galiza, uma região de Espanha, peculiar sem dúvida, pelas semelhanças geográficas e religiosas (leia-se Santiago), mas pouco mais do que isso.
Mas o que é mais curioso e fantástico é que tenhamos ainda hoje, após tantos séculos de afastamento e isolamento, tanto em comum e que esse cidadão médio português, mesmo tendo um desconhecimento total do galego e da Galiza, se identifique com estes quando confrontado com os mesmos.
N.G. Para além das múltiplas conotações (muitas delas pejorativas, outras de índole agrícola) que subsistem por todo o país, o Galego é ainda o habitante da Galiza. Tenho ideia que na raia com a Galiza se utilize, por vezes, a palavra 'Galego' ao invés de 'espanhol'. Claro que quanto maior é a distância à raia, menos existe 'Galiza' e 'Galegos', mas apenas 'Espanha'. Não por má vontade, mas apenas por desconhecimento.
E para vós?
J.A. O que é para mim o galego? É uma variante da minha língua, da nossa língua. É uma variante que procura o seu caminho, que procura simultaneamente a sua afirmação e sobrevivência. É uma variante que no seu território natural luta em condições desiguais com uma outra língua que é imposta "oficialmente" em todos os meios. É uma variante de léxico riquíssimo e onde encontro muitas vezes, palavras que ouvia, palavras que uso amiúde, que pensava ser regionalismos meus, mas que afinal são muito mais mais do que isso.
N.G. O Galego é o irmão estrangeiro. O irmão emigrado, de fala contaminada mas de coração leal. Pobre mas honrado.
Que sucedeu para vos singularizardes na percepção que tendes da Galiza e do seu idioma a respeito dos vossos e das vossas compatriotas?
J.A. Para mim, sem a menor dúvida, o contacto com o PGL e consequentemente, o contacto com o reintegracionismo. Daí surgiu em mim a necessidade, a vontade, de ajudar um pouco no por fim da farsa que nos foi imposta a todos, portugueses e galegos, durante séculos.
N.G. Li uma vez uma crónica bem-humorada de um galego que se dizia um 'travesti da fala' (a expressão não seria exatamente assim, mas a ideia era essa), por ter de se transformar para utilizar a que ele achava ser a língua correta. Para perceber melhor a Galiza e o substrato 'galego' que subsiste, tive me alhear do ativismo castelhanista que comanda a sociedade galega. Imagino que os outros portugueses não têm vontade de ver para além do superficial. Se já não sentem amor ao bairro ou à cidade em que vivem, porque haverão de sentir afinidade por um 'bairro' assim distante como a Galiza?
Que meios e estratégias vos ocorrem para que a vossa percepção da realidade galega se chegue a estender em Portugal?
J.A. Uma delas será a recepção de um modo recíproco das televisões portuguesas na Galiza e da Galega em Portugal. Tenho a certeza que haveria nitidamente um tempo antes da recepção das TVs e um outro depois da recepção das TVs. A principal causa do desconhecimento mútuo existente ainda hoje, de que falei na resposta à primeira pergunta, é a secular falta de informação, o isolamento informativo, a que fomos obrigados em ambas as beiras do Minho, pelos centralismos de Lisboa e Madrid.
Outra medida seria, também sem a menor dúvida, a assunção plena por parte de uma Xunta da Galiza, de Portugal como o seu principal público alvo, o seu principal mercado extra-galego em aspectos culturais, sociais, linguísticos e naturalmente económicos, dadas as afinidades que até os mais cépticos reconhecem existir.
N.G. Penso que primeiro, a cultura galega em que acredito, a reintegrada (firmemente assente na idiossincrasia da Galiza, resguardada dos males de Castela e sem as costas voltadas para Portugal), tem de se afirmar na Galiza pela qualidade e modernidade das suas propostas. De seguida, Portugal. Acho que será sempre pela cultura que as afinidades se acentuarão.