« Crónica gráfica da Repichoca Ártabra | A Fundaçom Artábria voltou a reivindicar em Ferrol a figura de Ricardo Carvalho Calero » |
Reproduzimos intervençom do companheiro Xende Lopes em representaçom da diretiva da Fundaçom Artábria na homenagem a Carvalho Calero decorrida hoje em Ferrol Velho.
Cinco duros pagavamos de aluguer.
Era um terceiro andar, bem folgado.
Pola parte de atrás dava ao Campinho,
e por diante à rua de Sam Francisco.
(...)
Companheiras, companheiros, amigas e amigos,
Antes de mais, quero agradecer-vos, em nome da Fundaçom Artábria, a vossa presença neste acto de homenagem à figura do professor Ricardo Carvalho Calero.
Redigindo a minha intervençom, nom encontrei melhor maneira de começar esta, que com os versos torpemente recitados anteriormente, extraídos do poema Ferrol, 1916, em que Carvalho Calero falava com agarimo desta a sua hoje ruinosa casa natal, ante a qual nos encontramos e que, outrora, foi umha formosa vivenda de arquitetura tradicional, situada neste bairro proletário e marinheiro de Ferrol-Velho.
Hoje, nesta chuvosa manhá de domingo, tenho a grande responsabilidade de recolher o testemunho de outras companheiras e companheiros de grande valia inteletual que, em passados anos, dedicárom as suas palavras ao ilustre ferrolano no aniversário do seu passamento.
Mas pouco podo dizer que nom se tenha dito já sobre o Ricardo em outras ocasions. Sim, o Ricardo. Ides permitir-me que, chegado a este ponto, faga um pequeno parêntese em tal solene acto e tome estas confianças; pois se bem, tal e como imaginaredes, nom fomos coetáneos, nem compartilhei mesa e café com ele, sim o sinto mui próximo. Ele é esse professor de quem nunca fum aluno, mas de quem aprendim qual era o inequívoco lugar do galego no mundo.
Enfim...
Vós, eu... Nós... Conhecemos as múltiplas facetas do homem que hoje homenageamos; mas nom sei qual destas facetas é a que temem as instituiçons e que converte a figura de Carvalho na figura mais inexplicavelmente desprezada e esquecida polo desvergonhado e falto de escrúpulos oficialismo do nosso país.
Quiçá seja a faceta do Carvalho professor e inteletual; primeiro Catedrático de Lingüística e Literatura galega da universidade de Compostela e figura comprometida com a dignificaçom da nossa língua e do nosso património cultural; precursor e firme defensor das posiçons reintegracionistas que, seguro, tenhem provocado mais dumha urticária a afamados membros da mui real e monárquica Academia Galega.
Talvez seja o Carvalho poeta, romancista, ensaísta e dramaturgo; prolífico literato que nos deixou inúmeras obras, sem as quais, sem dúvida, haveria um grande vazio nom só na história da literatura galega, mas também na história da literatura universal; e para cuja criaçom nunca renunciou aos seus principios.
Ou bem será o Carvalho político; co-fundador do Partido Galeguista, redator do Rascunho do Estatuto de Autonomia de 1931, orgulhoso nacionalista e incansável luitador antifascista, que pujo a sua vida em jogo pola sua tenaz defesa do reconhecimento do nosso ser como Povo e como País ante os pais e avós dos imbecis e escuros que hoje nos governam e que, tal e como figeram os seus antepassados, querem sumir-nos na mais profunda ignoráncia e no esquecimento.
Seja qual for, após vinte-e-três anos da sua morte e passados cento-e-três do seu nascimento, continua sem receber a homenagem e reconhecimento que merece por parte das instituiçons. Umhas instituiçons que sempre demonstrárom nom ter um interesse real em recuperar a figura deste inteletual íntegro, mais alá do seu habitual oportunismo; maquilhagem para tapar a sua inoperáncia e a sua hipocrisía. E o exemplo mais próximo no tempo o temos no governo municipal de Ferrol, que recentemente acaba de solicitar, mais umha vez, a dedicaçom do Día das Letras para Ricardo Carvalho Calero ao tempo que os concelheiros e concelheiras do Partido Popular ignoram a Ordenança Municipal de Normalizaçom Lingüística, multam ativistas culturais por participarem, precisamente, numha homenagem ao professor neste mesmo cenário há um ano ou deixam que apodreça e caia este valioso elemento do nosso património imóvel, diante do qual hoje nos concentramos.
E falo de patrimônio imóvel porque no terceiro andar deste prédio número vinte-e-um da rua Sam Francisco de Ferrol abrolhou a semente dumha parte do que somos.
Porque nós somos língua. Somos reintegracionismo. Somos Povo e somos País. Somos Galiza. Somos terra e somos mar. Somos o tojo e somos o arrecendo a salitre. Somos o operário, somos a camponesa e somos o marinheiro. Somos o martelo, a fouce e também a rede. Somos tradiçom; somos música e somos literatura. Somos dignos e somos rebeldes. Somos insubornáveis. Somos Castelao, Rosalia, Curros e Pondal. Somos Alexandre Bóveda e Moncho Reboiras. Somos Lola e José. Somos José Sanmartim Bouça.
Somos Ricardo Carvalho Calero.
Saúde e Pátria. (obrigado)
“A nossa língua floresce em Portugal” Castelao.
“A minha pátria é a língua portuguesa” Pessoa.