A supremacia do capital financeiro: (1)

30-04-2006

  10:27:13, por Corral   , 1637 palavras  
Categorias: Outros, Ensaio

A supremacia do capital financeiro: (1)

por James Petras

Não existe sector da economia dos EUA que, nos anos mais recentes, tenha conseguido igualar as maiores instituições financeiras, tanto em termos relativos como em absolutos. Para o primeiro trimestre de 2006, findo em Fevereiro, o banco Goldman Sachs (GS) superou o record absoluto da Wall Street, anunciando lucros de 2,48 mil milhões de dólares (anualizando atingirão mais de 10 mil milhões de dólares). Os lucros foram superiores em 64% relativamente ao mesmo período do ano anterior (apesar de ter sido também um ano muito lucrativo). A rentabilidade dos recursos próprios alcançou 38,8%, o que representa também um valor record. A receita total bruta atingiu os 10,3 mil milhões de dólares. O GS obteve lucros recordes em cinco dos últimos nove trimestres ( Financial Times, FT, 15/03/2006, p 1).

Por outro lado, o banco Morgan Stanley declarou um aumento dos lucros de 17% totalizando 1,64 mil milhões de dólares também durante primeiro trimestre que terminou em Fevereiro de 2006. A receita total bruta aumentou 24%, enquanto no ano anterior esse aumento foi de 19,7%. O Lehman Brothers declarou um aumento de 24% dos lucros no primeiro trimestre de 2006 atingindo o seu valor record de 1,1 mil milhões de dólares. A receita total bruta aumentou 17% chegando aos 4,5 mil milhões de dólares. O Bear Stearns (BS) juntou-se à dança dos milhões de Wall Street, declarando para o primeiro trimestre lucros de 514 milhões de dólares; os lucros foram superiores a 34% relativamente ao ano anterior. A nova receita total bruta do BS cresceram 19% atingindo 2,3 mil milhões, enquanto o retorno para os accionistas subiu 20,1% no primeiro trimestre de 2006. Os lucros combinados destes 4 bancos totalizam 5,73 mil milhões de dólares durante o trimestre Novembro de 2005 a Fevereiro de 2006, ou 22,9 mil milhões considerando o resultado anual ? e isso não inclui os lucros de três dos cinco bancos de topo (Citigroup, JP Morgan e Merrill Lynch) cujos trimestres decorrem entre Janeiro a Março de 2006, dos quais são esperados igualmente lucros elevados, duplicando para além dos 12 mil milhões de dólares neste primeiro trimestre, e que atinjam um valor próximo de 50 mil milhões para o ano de 2006.

Nenhum outro sector da economia pode ostentar taxas de retorno tão elevadas, nem mesmo qualquer uma das sete maiores empresas podem sequer igualar os lucros recordes. Os bancos conseguem os seus maiores lucros de sempre facilitando a concentração e centralização do capital (operações que designam por "fusões e aquisições"), cobrando taxas lucrativas de "assessoria" e subscrevendo os financiamentos das fusões e aquisições. A segunda fonte de lucros está na especulação em geral, inclusive sobre a negociação da dívida dos países e apostando nos mercados mundiais de valores, nomeadamente em energia onde o Goldman e o Morgan têm "feito uma fortuna nos últimos trimestres".

Enquanto nos EUA, os consumidores, os políticos demagogos e os activistas anti-guerra, culpam os países produtores de petróleo, esquecem completamente a responsabilidade que os grandes bancos especuladores têm na subida do preço do petróleo.

O aspecto político fundamental é que a força motriz do sector económico mais importante nos EUA ? os serviços ? é o sector financeiro, precisamente aquele que menos se ocupa da actividade produtiva, ou seja, a produção de bens e serviços para a população. Pois para além dos seus elevados lucros, também as gratificações e salários astronómicos das suas elites dirigentes, assim como a sua acção para a concentração do capital, têm tido um forte efeito na crescente desigualdade salarial. Os custos que os bancos impõem às empresas pelos seus "serviços" tem contribuído para um endividamento que consequentemente tem originado despedimentos maciços e redução dos benefícios da segurança social, como parte das medidas de "assessoria" dos bancos envolvidos.

Além de desenvolverem as suas actividades especulativas, os bancos estão a ser cada vez mais importantes accionistas em sectores não-bancários. Eles têm desempenhado o principal papel na redução dos custos de mão-de-obra, e na redução investimentos de longo prazo na investigação e tecnologia, como forma de maximizar os lucros a curto prazo. Por último, a fonte mais lucrativa e a mais dinâmica dos seus lucros especulativos, está na sua expansão no estrangeiro, particularmente na Europa e especialmente na Ásia. Por exemplo, o banco Lehman Brothers anunciou em meados de Março de 2006 uma " agressiva expansão na Ásia". Pois enquanto a receita total bruta, e em termos globais, foi superior a 17% como vimos, esse mesmo índice no estrangeiro como um todo, atingiu 30%, chegando aos 67% só na Ásia. David Goldfarb, director administrativo, declarou que aquela expansão para a Ásia era o "a prioridade número um" do Lehman. Todos os principais bancos têm, ou estão no processo de estabelecer, posições fortes no sector bancário da China e da Índia. O imperialismo financeiro está a tornar-se no principal instrumento da construção do império no século XXI.

Capital financeiro: Poder político e política económica

O capital financeiro exerce uma enorme influência sobre a política económica governamental através da sua representação directa no organismo de controlo da política monetária dos EUA: o presidente da comissão executiva da Reserva Federal (FED). Os principais critérios exigidos ao presidente da Reserva Federal, são a "confiança", ligações estreitas e relações sólidas que o candidato deverá ter com Wall Street. Esses mesmos critérios são aplicados a todas as pessoas nomeadas para o Tesouro norte americano, para o Banco Mundial e para o Fundo Monetário Internacional. Durante muito tempo, o presidente do FED, Alan Greenspan, foi muito respeitado e louvado, não pelo seu péssimo desempenho económico, mas pelas suas políticas favoráveis aos banqueiros de Wall Street. Durante a presidência de Greenspan, a economia dos EUA foi desindustrializada, deu-se a acumulação de um enorme défice comercial e orçamental, e registaram-se duas bolhas especulativas (tecnologia de informação e caixas económicas). Ele presidiu a uma economia que alcançou níveis de endividamento público sem precedentes ? duplicaram em cinco anos. O apoio de Greenspan à redução de impostos para os ricos (rendimentos, benefícios de capital, etc) contribuiu para o enorme défice orçamental e para as crescentes desigualdades. A sua política de baixas taxas de juros alimentou as bolhas especulativas à custa do investimento produtivo. O seu apoio à desregulamentação do capital (denominada "globalização") conduziu à deslocalização para o estrangeiro das multinacionais norte americanas (muitas das quais exportam para os EUA) produzindo enormes défices comercial e da balança de pagamentos. Ainda que todas estas políticas tenham conduzido ao estado desastroso actual em que se encontra a economia nacional, elas criaram no entanto condições extraordinariamente favoráveis para a expansão do capital financeiro, no interior e no exterior dos EUA, e originaram a concentração e a centralização dos bancos em dez grupos de controlo.

O impacto da Wall Street na economia e na estrutura social pode ser melhor ilustrado examinando a cidade de Nova York, o seu centro de operação. Em primeiro lugar a distribuição da propriedade na cidade de Nova York é uma das mais desiguais no mundo. Pouco mais de 1% da população controla mais de 80% dos recursos. Tal situação é equivalente ao que se passa na Guatemala ou no Brasil. Em segundo lugar, a Wall Street tem uma ligação muito estreita com o capital imobiliário em Nova York, e ambos foram instrumentos para o aumento dos valores da propriedade e do mercado de arrendamento, o que levou à destruição de mais de 500 mil postos de trabalho na industria durante as últimas três décadas. A maioria das propriedades industriais foram "redimensionadas" libertando áreas para serem utilizadas na edificação de espaços dedicados a escritórios para actividades relacionadas com o mundo financeiro e alojamentos para financeiros ricos. O senador Schumer do estado de Nova York, um conhecido defensor da Wall Street, liderou nos EUA uma campanha para converter a China em bode expiatório, pela perda de postos de trabalho na indústria, ignorando o papel determinante do capital imobiliário, na destruição deliberada de imóveis do sector industrial na cidade de Nova York. Claro que a falência da indústria da cidade de Nova York não se deveu unicamente ao capital financeiro. Tanto os capitalistas locais do ramo dos têxteis como os sindicatos são parte responsável nesse processo ao apostar em mão-de-obra barata por forma a conseguir competir ? uma aposta ineficaz face à China ? em vez de actualizar tecnologicamente as unidades, computorizando o projecto e a produção, e de dedicar essa industria a produtos de alta qualidade. Os sindicatos (International Ladies Garment Workers Union (ILGWU, mais tarde denominado UNITE) apoiaram a estratégia de mão-de-obra barata dos patrões das fábricas de vestuário, permitindo de facto, mas discretamente, que os salários caíssem abaixo do salário mínimo e que isso ficasse consignado nos acordos colectivos de trabalho. Sem dúvida que as diferenças étnicas e de classe entre os patrões judeus, com salários de seis dígitos, e os trabalhadores asiáticos e latinos mal pagos, assim como a posição habitual dos patrões relativamente às questões étnicas e de classe, facilitaram a aplicação destas políticas fracassadas: a perda de competitividade industrial e perda de postos de trabalho.

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