Alberto Piris
Um alto dirigente de um país estrangeiro, de recente visita em Madrid, somou-se, com suas declarações públicas, a certo sector de cidadãos espanhóis que maquinam, de formas diversas, incumprir uma lei, democraticamente promulgada, que ao reorganizar os planos didácticos nos centros de ensino de nosso país (públicos e marcados) inclui neles uma matéria denominada? Educaçom para a Cidadania?
Esta matéria, segundo uma interpretação puramente confessional? Que esta no fanatismo religioso? Vulnera os direitos humanos. Como declarou o porta-voz da Conferência Episcopal. Surpreendente manifestação de quem, como membro destacado do máximo órgão da hierarquia católica em Espanha, nom deveria ignorar a histórica trajectória de sua Igreja, em sistémica e tenaz oposiçom, ao passo dos séculos, a qualquer avanço nos citados direitos humanos.
Ocorre que, para apoiar a esse sector de cidadãos decididos a incumprir a legalidade, se amparando em seu pretendido direito à objecçom de consciência, visitou Espanha o secretário da Congregaçom para a Doutrina da Fé (dantes chamada Santo Oficio da Inquisiçom), um das mais altas jerarquias do Estado da Cidade do Vaticano, com o que Espanha mantém relações diplomáticas de carácter privilegiado
Sabe-se que o Núncio do Vaticano em Madrid tenha sido convocado no Ministério de Assuntos Exteriores para pedir explicações por tão evidente ingerência no que são assuntos próprios dos espanhóis? Ou que tenha sido chamado a consultas o embaixador de Espanha na Santa Sede, com análoga finalidade?
Porque para valorizar melhor este assunto bastaria com imaginar que tivesse ocorrido se qualquer membro destacado da Governaçom russa se tivesse permitido actividades de análogos caris. ¡Quantas vestiduras rasgadas e quanta santa ira em rádios e periódicos sobre a insuportável intromissom de um estado estrangeiro em nossa política interior!
Sirva este exemplo para cobrar consciência da favorável vara de medir que em Espanha se aplica a tudo o que, ainda de refilom, roça à Igreja de Roma, e da necessidade urgente de normalizar tão anómala situação.