Venha, a ver se nos vemos...

Venha, a ver se nos vemos...

21-06-2011

CONSULTA:

Gostaria de saber qual é a forma galega da expressom, eu acho que espanhola, "a ver", em frases tais como: "a ver como fazemos", "a ver o que se passa", "vais ao cinema? a ver"...
E do famoso "venha", que é um decalque do espanhol, "Venha, vemo-nos depois", "Venha, falamos"... A forma substitutiva que eu tenho escuitado aos nossos velhotes é "ala", mas também me soa a espanholada. Aos portugueses nalguns casos, escuitei-lhes "força"...

Obrigado pola vossa resposta e ajuda.

Nunes

RESPOSTA DA COMISSOM:

A ver

A expressom 'a ver' tem origem em diversas formas conjugadas (vamos a ver, voy a ver...) da perífrase espanhola ir a ver (gal. ir ver), com o verbo auxiliar elidido. Isto vê-se bem em frases castelhanas em que o verbo auxiliar permanece a certa distáncia do resto da locuçom verbal, que parece ganhar independência para transmitir a ideia de desejo ou dúvida:

Vete hasta su habitación, a ver si ha venido (Vai ao quarto dele, (para) ver se véu.)

Convertida em bordom (apoio para falar sem funçom semántica ou morfossintática) introdutor do discurso nesta língua, facilmente entrou nas falas galegas (como nas bascas e nas catalás), junto com outras muletas de origem também claramente espanhola: bueno, vale, venga... Amiúde, todos estes bordons aparecem combinados:

Bueno, vale, venha, a ver se começamos a trabalhar.

Na língua viva, o galego já carece de bordons discursivos genuínos tam amplamente estendidos como os referidos, apesar de estes de origem castelhana serem de introduçom relativamente recente.

No primeiro caso que nos ocupa ('a ver'), a soluçom mais fácil, e decerto aplicada e aplicável em muitos casos, será a traduçom à letra da perífrase para o galego quando esta transmitir a ideia de desejo ou dúvida: vamos ver (que costuma ser reforçada pola partícula enfática além Minho: vamos lá ver):

Quero ler-vos um parágrafo deste livro. Vamos ver se gostades!
Vamos ver se temos sorte.
Vamos ver se acabamos cedo.
Vamos ver como fazemos.
Vamos ver o que se passa.

Porém, o valor desta expressom nem sempre é tam 'literal', aproximando-se da pura muleta em grande parte dos usos que tem. Daí que nem sempre dê jeito a mera adaptaçom proposta no parágrafo anterior. No português atual encontramos numerosas alternativas que nom se limitam ao simples decalque praticado por utentes modernos da língua na tentativa de evitarem esta construçom tam caraterística do espanhol: bem, bom, pronto... até a pura supressom da expressom, como vemos nos dous primeiros exemplos:

1. A ver se atendes, que assim nom aprendes nada> Atende! Que assim nom aprendes nada.
2. A ver se atendes, que assim nom aprendes nada> Era bom que atendesses, que assim nom aprendes nada.
3. A ver, quantas pessoas vinhérom?> Ora/Vamos ver/Vejamos, quantas pessoas vinhérom?
4. A ver, vou começar por dar os parabéns...> Bom/bem, vou começar por dar os parabéns...
5. A ver, já me estou a amolar> Pronto, já me estou a amolar.
6. Vais ao cinema? A ver...> Vais ao cinema? Há-se de ver./Logo se vê...

Nom se deve confundir a perífrase espanhola com a perífrase galega ocidental e padrom ir a ver (=ir vendo). Tampouco com 'a ver' com o valor de 'para ver' ou 'que ver', caraterístico do português lusitano contemporáneo:

Vamos a ver a paisagem pola janela do carro. = Vamos vendo a paisagem pola janela do carro.

Falei com ele a ver o que se pode fazer. = Falei com ele para ver o que se pode fazer.

Isso nom tem nada a ver com aquilo.=Isso nom tem nada que ver com aquilo.Fum eu a ver o aviom antes que ninguém.=Fum eu que vim o aviom antes que ninguém.

Venha!

Quanto à interjeiçom venha!, quando usada para encorajar ou apressar umha açom, tem igualmente origem espanhola recente (¡venga!), e ainda é desconhecida na fala das pessoas de certa idade, que usam outras expressons como vamos!, dá-lhe! ou, efetivamente, ala!, tam galegas como portuguesas.

Para além dessas, a voz força! também se usa em Portugal para encorajar umha açom, mas carece da mesma intensidade que as anteriores, podendo equivaler a umha simples resposta afirmativa:

Posso/Podo entrar? Podes. (Portugal e Galiza)
Posso entrar? Força. (Portugal)

No entanto, sem dúvida, a voz lusitana equivalente à forma espanhola venga! mais habitual é vá (lá)!, formada a partir do imperativo do verbo ir (repare-se que em castelhano se forma a partir do imperativo do verbo venir). Nas falas galegas, este português equivale formalmente a vaia, forma castelhanizada de terceira pessoa do presente do conjuntivo e do imperativo do verbo ir. Tendo em conta esta e outras cautelas, qualquer umha das alternativa apresentadas nos parece melhor que o uso do decalque moderno do espanhol venha!:

¡Venga, levántate ya!> Vá, levanta-te aginha!

tags: 'a ver', venha!
Categoria(s): Morfossintaxe
Chuza!

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