Um barulho de grilos reina agora sobre os campos segados;
pacotes abrasadores de palha de arroz enchem a planície atordoada.
Os lavradores sentam-se ao pé dos seus lares a desfrutar das longas noites,
tiram o pó das esteiras e preparam-se para a primavera.
Quando as famílias de lavradores se reúnem e conversam
as palavras 'verdade' ou 'mentira' nunca são pronunciadas.
As pessoas da cidade não têm tanta sorte -
esses coitados têm de ajoelhar-se e dobrar o lombo todo o dia.
(Ryôkan)
Partir para partir cruzando as pernas
realizando a dor deste universo
numa náusea respirada pouco a pouco
aparecida no interior dum respirar a modo.
Tenho nojo do nojo e medo a ver-me
tão fraco como sou, tão reticente,
longe de quê,
esse eu que se estende onde eu não chego.
Tenho nojo de quê.
O nojo é um medo a respirar o mundo
a dissolvê-lo com a força dos pulmões que empurram
para cima o coração e para baixo os intestinos.
Pernas de madeira a chiar na noite do cérebro.
Saltar para o outro lado do alento.
Respirar com as árvores de Luz Serena.
Este tesouro foi descoberto numa moita de bambu -
lavei a tigela numa nascente e depois consertei-a.
Depois do zazen da manhã, tomo nela os meus purés;
à noite, serve-me a sopa guenmai.
Partida, gasta, roída pelo tempo e deformada,
mesmo assim ainda é um bem prezado!
A partir de agora
nem sequer serás molestada
por um pontinho de terra.
Noite e dia ao meu cuidado,
já nunca estarás só!
(Ryôkan)