uma teia de aranha recém feita
chamando
como uma vela
em meio da janela aberta
e cá está ele
o pequeno mestre
a navegar
num fio de leite
deseja-me sorte
almirante
há muito tempo que não
acabo nada
(Leonard Cohen)
E qual o limite exato
que separa o rio da terra de que bebem
estas árvores refletidas na água?
Onde estão as raízes dos reflexos
destes amieiros e carvalhos
a beira-rio?
A gravitação dos astros, a rotação
da terra, o simples peso
da combinação infinita de duas partículas
de hidrogênio e apenas uma
de oxígeno
movem o fluxo de que bebem
os javalis e os olhos dos amantes.
À beira desta terra passa água.
Dizemos que o Minho corre para o mar.
Dizemos Mera, Parga, Ladra,
Narla, Rato...
Os nomes construíram geografias
em que habitamos,
mapas que desenhamos
no território de um país fantasma.
A fantasia de conhecer o espaço
modificou o mundo à nossa imagem.
Destes moinhos e caneiros
nasceram as barragens que assolagaram vidas,
e iluminaram noites.
À beira desta água nós passamos
vida ante vida.
Apesar dos mapas,
fluímos.
Diluídos no tempo
somos
o que fazem de nós as margens e os caneiros
que nos conduzem as águas.
Domesticamos as correntes mas ignoramos
o seu mistério.
O Minho não existe.
Os átomos não são certezas.
Água
é só um nome.
Nem sequer o reflexo
da rama a tremer na superfície
oferece uma ideia a que agarrar-se.
Eu não te necessito.
Se não estás
estou sozinho ou com outras pessoas
e não se passa nada.
A tua ausência
não enche o coração de ausências,
porque a minha vida
não és tu.
O meu coração,
que tu tão bem conheces,
também não te pertence.
Afinal, estou a usá-lo
e necessito-o
também com outra gente.
Mas contigo estou melhor que sem ti.
Tu dás valor a coisas que antes nem considerava.
Há algumas que com mais ninguém
consigo compartir.
Contigo o coração é terno
mas não eterno.
Contigo é mais fácil sentir amor à vida
e talvez seja por isso
que a vida te ama
através de mim.
E isso
é
tudo.
E mais nada.