mina
mina

gostava de falar de corcoesto
cabana de bergantinhos
galiza
mas faltam-me palavras
para dizer
enchi
distrito aomin-suaman
ghana

quero falar de corcoesto
e chego definitivamente tarde
á floresta tropical

quantas palavras
já deitei na lixeira procurando o verso certo

quantas vezes busquei a informação precisa
para o verso preciso
que nunca chega

mas quero falar de corcoesto e enchi

debruço-me a esta janela que é um ecrã em branco
e deixo que as palavras digam
da ética do ganho por cima de qualquer coisa
o mundo à volta do lucro sem pensar na terra que vamos deixar aos filhos
os filhos e nós próprios a respirar arsénico ou cianeto
a facada à paisagem que nunca mais seremos
o ouro como metáfora do valor deslocado da realidade ao símbolo
a cegueira de uma promessa que são só palavras vazias de político medíocre

sinto-me intoxicado ao ver no ecrã da sala tanta mentira repetida uma e mil vezes

mentiras de ouro
mentiras de arsénico
mentiras de cianeto

então deito-me no sofá e fecho os olhos

e quero falar de enchi mas não sei que coisa seja corcoesto nem ghana
nem o cianeto nem o arsénico nem balsas

o ouro agarra-se-me aos dedos e não posso mover um músculo

o arsénico no cérebro faz que não respirem os neurónios
o cianeto envereda nos pulmões e mal respira o meu corpo

e logo a dor de cabeça os vómitos os desmaios
e acordo e fiz cocó sobre mim próprio
e acordo e fiz xixi sobre os meus versos
e acordo e fiz cagada sobre a paisagem de corcoesto
ghana cabana de bergantinhos enchi planeta galiza mundo

e então abro os olhos
e falo de corcoesto
e enchi

a mesma mina
a céu aberto
e coração fechado