Haiti e as esquerdas latino-americanas

27-02-2007

  13:26:38, por Corral   , 561 palavras  
Categorias: Outros, Dezires

Haiti e as esquerdas latino-americanas

Raúl Zibechi
La Jornada

Em todo caso, as esquerdas do continente produziram uma viragem radical sem debate e com o sozinho argumento de que agora são Governo. É o que sucedeu em Uruguai, país que contribui 750 soldados, o mais comprometido desde o lado quantitativo em relação a sua população. O que em julho de 2004, quando se criou a Minustah, era lhe fazer o jogo ao império, num ano depois se converteu numa atitude razoável para democratizar Haiti. Desse modo o parlamento uruguaio votou um importante aumento do contingente militar que a direita no Governo tinha decidido enviar num ano antes. Por lamentável que pareça, só um deputado em mais de 50 se atreveu a levantar a voz contra uma mudança de posição que se levou por diante princípios sem a menor consulta às bases da Frente Ampla. Os debates em Brasil, Argentina e Chile foram mais escassos ainda. Em Bolívia, Evo Morais bloqueou qualquer tentativa de debater o tema, segundo o ex ministro Andrés Soliz Rada.

No entanto, o que está em jogo é bem mais que questões de princípios. É verdadeiro que as governações de esquerda não devem se comprometer com o envio de tropas a outros países e menos ainda na flagrante violação dos direitos humanos, que em Haiti tem rasgos de genocídio contra os pobres. Efectivamente, é nos bairros mais pobres da periferia urbana de Porto Príncipe, esses lugares que Mike Davis sustenta que são "o novo palco geo-político decisivo", onde os capacetes azuis actuam com maior rigor. Brian Concannon, director do Instituto para a Democracia e a Justiça em Haiti, sustenta que "é difícil não advertir uma relação entre as grandes manifestações ocorridas em Citei Soleil e os bairros que a ONU seleccionou para realizar extensas operações militares".

Do que se trata é de uma guerra contra os pobres encabeçada por Governos que se dizem afines aos pobres. Existe uma estreita relação entre as actividades de nossos soldados nos bairros pobres de Haiti e a militarizaçom das favelas e os bairros pobres das grandes cidades sudamericanas. O deputado brasileiro Marcelo Freixo sustenta que "as favelas constituem o espaço ocupado pelo inimigo público, um espaço de ausência de direitos que vem a representar o desordem, a insegurança, a tal ponto que se chegou a colocar um tanque de guerra apontando contra uma comunidade". Uma política de segurança que substitui a ampliação de direitos aos jovens negros pobres que habitam as favelas. Nesse sentido, a Minustah actua igual que o exército brasileiro nas favelas: criminalizando aos pobres.

Num século atrás a social-democracia alemã cruzou o Rubicom ao apoiar a colonização do terceiro mundo e a guerra imperialista de 1914. Essa atitude para a política externa atingiu sua correlato doméstico na repressão ao movimento operário que teve nos assassinatos de Rosa Luxemburg e Karl Liebknecht seu custado mais escandaloso. Uma esquerda manchada com sangue dos de abaixo deixa de ser esquerda. A solidariedade com a esmagada população de Citei Soleil é urgente, mas a melhor forma de defender-nos dos abusos que têm na guerra contra os pobres quiçá o flanco mais ignominioso das governabilidades progres e de esquerda.

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