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Namorar ao contrário

Não sei quem foi que disse, com tão bom critério, que as coisas que não se dizem é como se não tivessem acontecido. Lembro a frase e venho à janela do meu blogue mais uma vez para gritar ao mundo as minhas últimas verdades. Bàrbara deixou-me. Disse bem: deixou-me. Ainda que fosse eu a dizer que queria acabar a relação, foi ela que disse, no domingo à noite, recém chegado eu da Galiza, que precisava tempo para pensar nisso que, passados três dias do choque inicial, sei que não precisa pensar, apenas virar consciente. A decisão está tomada. Já estava antes de eu chegar da Galiza. A dúvida, neste caso, é uma verdade intuída que choca com todas as evidências: não me ama. Mas a esperança, essa mãe de todos o demos, impede-me virar consciente eu próprio dessa mesma verdade. Surpreendo-me a mim próprio pensando que volta. O meu piso está cheio de toda a sua roupa, os presentes que eu próprio lhe fiz, o seu lixo, a sua desarrumação. Foi-se para pensar, mas parece-me que fosse visitar os pais. E quando agora mesmo entrou pela porta para jantar (a precariedade de quem foge por surpresa) parecia-me impossível não darmo-nos um beijo nos beiços, não abraçá-la quando me dizia que lhe dói tudo por ter dormido num sofá, não oferecer-lhe uma massagem nessas circunstâncias, não ter o contacto físico de costume. E porém não fiz nada disso. Quem foi quem lhe deu um beijo na cara apenas na chegada e na despedida? Custa acreditar que fosse eu. Claro que a sua forma de agir não convidava a fazer mais do que isso. E quer pensar? Pensar o caralho. Desfazer-se da deriva de pensamento e acção. Isso é tudo. A mesma deriva que a levou, hoje à tarde, quando me viu na escola, a dar-me um beijo nos beiços (com o milissegundo conseguinte de surpresa na sua própria cara), a apanhar o telefone na casa, sem pensar que o telefonema era para mim, e achando os meus pais do outro lado do fio. Porque nenhum dos dois sabíamos que fazer. Estávamos a criar um hábito inexistente. Quanto à forma de agir (e só nisso) éramos como o homem e a mulher que querem começar a namorar. Os mesmo nervos, o mesmo mover-se de cá para lá, evitando o contacto visual. Ou fui eu só que fez isso? Seguramente fosse eu só. E se calhar é isso que me toca agora. Namorar ao contrário. E se consigo fazê-lo e normalizar uma amizade que agora tudo me indica que é contra o sentido comum, que me impedirá, depois, deixar de fumar? A minha frialdade supreende-me a mim próprio ao escrever essas palavras. Mas é que escrevo como se ela estivesse na sala a ver televisão, estudar ou lá o que for, em lugar de ter atravessado, há quarenta minutos, a porta para a rua.

11-01-2006, intimidades

1 comentário

Comentário de: sabela [Visitante]
sabela

Sempre dói.

12-01-2006 @ 18:30