O problema do comunismo ? segredou-me recentemente o Subcomediante E-1 em reunião ultra-secreta ? é que Marx era péssimo contando anedotas, Lenine não sabia dançar a lambada e o Ché Guevara nunca viu os desenhos animados de Son Goku. Vinha a conto da conversa que estávamos a ter, há um par de fins-de-semana, quando eu voltei das Jornadas de Formação que o PSAN teve em L?Espluga del Francolí (Tarragona) e às que assisti com o Eduardo em regime de convidados simpatizantes.
Um dia o emigrado volta à terra e descobre assombrado que tudo continuou sem ele. É uma constatação um tanto absurda, como sacar a mão pela janela para sentir o contacto da chuva que se vê cair. Mas neste caso o contacto húmido da gota contra a palma faz acordar a vontade de ser um próprio água, virar chuva, voltar a ser parte do meio. Uma simples questão de perspectiva, porque o lugar sempre será o lugar, apesar do nosso sentido de pertença, e apesar de não podermos imaginá-lo sem nós, pela simples razão de que nunca o vimos assim. O observador que condiciona o objecto observado. O velho enigma da árvore que cai no meio do nada, sem que ninguém o veja ou ouça, mas cai, claro que cai. E nós que a vimos crescer, que talvez a regamos e adubamos, que pusemos nela a esperança de um dia ter a sua sombra, perguntamo-nos então como pôde ter caído sem nós. Sabemos mas perguntamo-nos só quando o vemos. Como sendo informados sobre a morte de alguém, sabemos -claro que sabemos -, mas a sombra da morte só nos cai em cima quando vemos o seu corpo inânime de olhos fechados. O retorno do emigrante é isso. Só que é a nossa própria vida a que jaze no caixão e são os nossos olhos os que estiveram fechados. É difícil ficar indiferente, muito mais fácil negar a realidade, culpar a terra. Num país de emigrados e retornados como o nosso devíamos sabê-lo. Seguramente saibamos. E porém, eis-me mais uma vez perante a evidência, surpreendido em flagrante. Pampo.
Há mulheres espidas a chorar pelos cantos à procura de serem reconhecidas como lágrima viva. Há homens espidos prestes a se tornar lágrima morta, pinga caída, olho assolagado na sua glândula lacrimal. Há corpos espidos a se procurar nos cantos, como quem procura roupagens nas ausências. Há palavras dançadas pelo ritmo: só há palavras dançadas pelo ritmo. O mundo é uma palavra dançada pelo ritmo no coração da terra, latejo a latejo, a dar-nos a palavra. É agora a sua vez, Ehus Mahot. Saiba que me interesso por tudo o que não me interessa. E não gosto de ser tratado por vosté.