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      Ciclo cineclube: Abril do 74 / Maio do 68

      Ciclo cineclube: Abril do 74 / Maio do 68

      18-04-16

      Abril 74 / Maio 68.
      Do lume que prendeu apenas ficam as cinças

      Abril do 74
      Dizia Francisco Martins, activista do grupo Política Operária, que se Portugal fosse honesta consigo própria, deveria celebrar o 25 de Novembro do 76 em troca do 25 de Abril do 75. O golpe de estado de Novembro liquida o processo revolucionário que sucede à queda da ditadura de Salazar presidida por Marcelo Caetano inaugurando umha nova etapa para Portugal sob o regime de estado liberal e as suas instituiçons de democracia formal que hoje agonizam. Dizia também que umha imagem serve melhor que todos os milhares de documentos que o Partido Comunista de Portugal tem elaborado sobre o processo revolucionário em curso PREC, para entender o fracasso revolucionário em Portugal. Esta imagem, que serve para retratar umha época, bem poderia ser a de Álvaro Cunhal, chefe do PCP, assinando o compromisso de obediência ao novo regime instaurado pola corrente direitista dos militares em troca da legalizaçom do partido, atraiçoando assim as camadas populares portuguesas que a golpe de ocupaçons de terras e fábricas, greves selvagens, autogestom dos serviços públicos, etc. criaram as condiçons precisas para a transformaçom revolucionária mais radical da Europa de pós-guerra. Mas forom outras as imagens que servirom para construir umha narrativa dos factos na versom do poder estabelecido, imagens recorrentes e lugares comuns destinados a liquidar da memória colectiva a intensa luita popular e revolucionária em Portugal e da luita armada contra o imperialismo português além mar, em benefício dumha ficçom que coloca o levantamento militar do 25 de Abril como o facto fundacional dum Estado de direito e liberdades em Portugal.

      Mais do que celebrar o 25 de Abril, no Cineclube Mádia Leva! procuramos restaurar da memória essas outras imagens perdidas que componhem um outro retrato de Portugal na altura, e também da luita armada nas suas colónias. Imagens que lhe serviram a Rui Simões em finais de 70 para realizar os dous filmes mais complexos e também mais completos sobre a tentativa revolucionária em Portugal. Rui Simões, seguindo a tradiçom documentalista do cinema militante dos 70, monta o seu filme através de imagens de arquivo. Em Deus, Pátria, Autoridade percorre a história moderna de Portugal, desde a instauraçom da república em 1910 até o fracasso revolucionário de 76, seguindo como fio os três dogmas fundacionais do regime fascista português, pronunciados num discurso de Salazar: Nom discutimos Deus e a virtude. Nom discutimos a Pátria e a Naçom. Nom discutimos a Autoridade e o seu prestígio. Seguindo o modelo de montagem dialéctica de Eisensten, Simões enfrenta um plano a outro que funciona como o seu oposto, a Assinatura de pacto de governo segue-lhe a discussom entre operários sobre o modelo de autogestom operária na fábrica, para construir a tese sobre a que levantar o filme, segundo a qual, a história de Portugal nom trata sobre mudanças de regime, senom sobre a luita de classes.
      Em o Bom povo português, seguindo a mesma lógica, mas centrando-se na revoluçom de Abril e o processo que seguiu, a trama fai-se mais complexa, fundem-se a sociologia e a antropologia, as discussons na rua com a análise política, os cantos nas tabernas com os discursos partidistas, a luita urbana com a ocupaçom camponesa, a aterragem em Portugal do embaixador Carducci e os EEUU montada a ritmo de Music Hall, etc. Simões recupera para a memória imagens perdidas, imagens significativas como a do nascimento dumha criança com que abre, esperançado, o Bom povo português, ou as imagens dum funeral com que se fecha, demolidor, o mesmo filme.
      Maio do 68.

      Também o Paris do Maio de 68 com as suas greves selvagens, a tomada da rua, o estado de sítio, foi sepultado, nom só pola vitória eleitoral de De Gaulle, mas também polos montes de imagens que se tenhem voltado icónicas, referentes da modernidade, símbolos dum mundo novo, mas sempre após a tentativa revolucionária ter fracassado. O relato hegemónico, em crise, por outro lado, vem dizer-nos, lá começou todo e nós estávamos ali, para enterrar os fantasmas da segunda guerra mundial, defendendo maior liberdade para os jovens, as mulheres. Muito polo contrário, do mesmo modo que se passa com a revoluçom de Abril, a crónica deve ser contada como o relato dumha morte, mesmo a dum suicídio, como em Morrer aos trinta anos, de Romain Goupil, um filme documentário que o seu director Goupil dedica ao seu companheiro de militáncia, Michel Recanati, nos comités de acçom directa e no partido da Juventude Comunista Revolucionária, que se suicidou em 1981. Morrer aos 30 anos funciona a vários níveis, por um lado é a crónica da luita de poder entre os dirigentes estudantis, por outro lado é o retrato pessoal de Goupil e os seus amigos através do cinema doméstico e do seu percurso político, e finalmente está o retrato pessoal de Michel Recanti, o seu ascenso à cúpula da JCR, a sua responsabilidade no recrudescimento do combate directo, e o seu perfil mais íntimo. Goupil emprega o material gravado por ele mesmo na altura, das manifestaçons contra a guerra de Vietname, das assembleias nas faculdades, da vida quotidiana dos militantes, das barricadas em Paris, para construir a crónica dum fracasso que levou a Recanti e tantos outros a inverter a máxima da revoluçom ou morte para a fórmula reformismo ou morte.. Hoje os livros de história só recolhem a primeira escolha mas forom muitos os que como Recanti escolherom a segunda, senom foi a morte física, o suícidio como no caso do protagonista de Morrer aos trinta anos, foi o isolamento, a enagenaçom, a drogadiçom e outras formas de morte social. O filme de Goupil é um retrato brutal, que serve de antídoto às leituras melancólicas e autocomplacentes da rebeliom alegre e juvenil de Maio de 68.

      Embora a Mae e a Puta de Jean Eustache seja um filme de ficçom cuja trama se desenvolve passado o Maio de 68, e só lateralmente se alude a ele, o certo é que, como em Morrer aos trinta anos, a Mae e a Puta vem marcado polo certificado de defunçom das expectativas revolucionárias de Maio de 68. Alexandre é um moço que se resiste a viver a normalidade pos-revolucionária e segue vagando polas ruas e os cafés de Paris, a sua moça, Marie cumpre o rol da mae, trabalha numha loja de roupa e é quem lhe proporciona a Alexandre sustento e casa. Alexandre conhece umha moça, Veronique, num café, ela trabalha como enfermeira e deita-se com quem lho pedir. Os três vem-se envolvidos num triángulo amoroso que se inicia como um jogo despreocupado contra o tédio, mas que pouco a pouco se irá revelando como umha farsa que oculta o vazio e a insatisfaçom de relaçons carentes de qualquer vínculo afectivo. O triángulo que representam Alexandre, Marie e Veronique corresponde-se à perfeiçom com a liberalizaçom do comportamento sexual da geraçom post-68, do mesmo modo que a perpetuaçom do patriarcado através da dialéctica da puta e da mae se corresponde com o fracasso revolucionário. Dizia o cineasta Philipe Garrell, que bebeu do cinema de Eustache, convém lembrar que após o ano 68 seguiu-se o ano 69, e que fica depois de as ruas de Paris terem ardido em 68? a saudade, o tédio, o cinismo, o cepticismo. Só acho digna a minha cobardia, di Alexandre, e no entanto será Veronique quem empurre o triángulo na procura dumha certa verdade, para o reconhecimento dum vazio, que nem a loquacidade boémia de Alexandre, nem a atitude acomodada de Marie conseguem encher de sentido.

      Escrito ?s 18:12:00 nas castegorias: album
      por SCMadiaLeva   , 1229 palavras, 220 views     Chuza!

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