Fernando Venâncio, O Galego Pasteurizado

13-10-2008

GAMANÇOS, LÍNGUA, GALIZA

Fernando Venâncio, O Galego Pasteurizado

O romance Inxalá, de Carlos Quiroga, saiu em 2006 na prestigiosa editora galega Laiovento, grafado na Norma Agal. Narra as peripécias da vida dum médico galego que tem de abandonar Portugal, onde trabalhou, e se refugia na Abissínia, onde recorda o amor, talvez para sempre perdido, duma portuguesa. O livro lê-se como um policial, como uma obra de cultura, e está magnificamente escrito. Carlos Quiroga (Periferias, O regresso a arder) é um exímio prosador.

Em 2008, a obra teve edição portuguesa, na Quid Novi, de Lisboa. Com um título mais longo, chama-se aí Inxalá. Espero por ti na Abissínia. É uma edição bonita, com uma sobrecapa primorosa.

Confesso uma intensa curiosidade, ao saber da existência dessa edição portuguesa. Que nela se mantivesse a Norma Agal parecia-me impensável. Mas, perguntava-me, que sucederia com o léxico exclusivo galego e, sobretudo, com a sintaxe em que um galego se exprime? Teriam sido, esses, conservados? Fui, pois, ver. Já o cólofon decentemente nos informa: «Revisão linguística para o português: Maria do Rosário Pedreira». Ao fim de quinze, vinte páginas, sabe-se o que essa «revisão» implica. A obra foi profundamente «revista». Digamos tudo: foi reescrita.


Nas edições portuguesas, que respeitam peculiaridades brasileiras, angolanas, timorenses, as galegas acabam implacavelmente trucidadas.


O resto aqui. Segundo Venâncio, todo o léxico e morfologia galegos foram substituídos por equivalentes portugueses, e mesmo "passagens inteiras acabam reescritas". Isto aconteceu com um livro do Carlos Quiroga, que escreve em grafia portuguesa e é professor de literatura portuguesa. Uma mensagem para Maria do Rosário Pedreira, editora da Quidnovi: eu não leio o Jorge Amado para que ele me soe português. Da mesma maneira que não leio o Quiroga para que não soe galego. Porque ele é galego e soa como tal quando escreve.

BLOGADO ?S 23:00:09

2 comentários

Comentário de: Nuno [Visitante]
Nuno

É estranho, dados os antecedentes do autor este não aprovou a “tradução"?

Seria no mínimo estranho que não a acompanhasse, a não ser que contratualmente esta fosse uma decisão exclusiva das editoras\representantes.

16-10-2008 @ 20:25
Comentário de: gomes [Membro]  
ptolo

Pelos vistos, a Maria do Rosário Pedreira não aceita nada que não seja português ‘estrito’. Não sei qual é a atitude dela quanto ao português do Brasil.

16-10-2008 @ 21:15
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